A recente sanção, com vetos, da Lei 15.134/25 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, reacendeu um debate necessário sobre os limites entre proteção institucional e privilégios corporativos. A norma, ao agravar as penas para homicídio ou lesão corporal dolosa contra membros do Ministério Público, da magistratura, da AGU, da Defensoria Pública e Oficiais de Justiça, quando relacionados ao exercício da função, parece, à primeira vista, legítima e coerente com a necessidade de proteger agentes que enfrentam riscos no cumprimento de suas atribuições. Mas é preciso perguntar: estamos criando um sistema penal que divide os brasileiros entre cidadãos comuns e cidadãos “semideuses”?
A Constituição assegura que todos são iguais perante a lei. No entanto, a nova lei caminha na direção contrária ao elevar certos agentes públicos à condição de grupo com proteção penal reforçada e tratamento diferenciado, mesmo em situações que outras categorias profissionais também enfrentam – como professores em áreas violentas, agentes de saúde em comunidades vulneráveis, assistentes sociais ameaçados em ações de proteção infantil, policiais, entre outros.
É compreensível que se deseje proteger aqueles que aplicam a lei ou defendem os interesses públicos, mas por que essa proteção não é estendida a todos que, de alguma forma, estão na linha de frente das políticas públicas? O risco real que enfrentam magistrados e promotores não pode ser negado, mas tampouco pode justificar a criação de castas dentro do funcionalismo público.
O mais preocupante não é a intenção da lei, mas a sua mensagem simbólica: a de que há vidas que merecem mais luto e mais punição do que outras. Essa hierarquização da dor e do direito à justiça corrói a confiança pública e desvirtua o espírito republicano.
O Brasil não precisa de leis que blindam figuras públicas; precisa de leis que protejam as pessoas — todas elas, sem exceção. Ao sancionar com vetos, o presidente Lula atenuou os exageros do texto original, mas o debate está longe de se encerrar.
Afinal, queremos proteger os servidores ou consagrar intocáveis? Essa resposta dirá muito sobre o país que estamos construindo.
Por Carlinhos Bragança