Opinião

Fogos ilegais, politização e o “Natal Luz” de Camaragibe

Pode ser que eu realmente enxergue apenas o ponto preto no grande quadro branco. Talvez eu seja, para alguns, a voz pessimista no meio da celebração ensaiada. Mas, numa cidade onde o “pão e circo” há muito substituiu políticas públicas, alguém precisa se arriscar a fazer o contraponto.

Camaragibe é, afinal, o lugar onde tudo pode faltar, saúde, segurança, educação, comida, menos o sorriso forçado de quem precisa sobreviver com a barriga vazia e a dignidade ferida. A festa nunca falta. O essencial, sempre.

É verdade que o prefeito Diego Cabral e sua equipe ainda tentam administrar o caos herdado da gestão anterior. É verdade também que alguns serviços começam a engatinhar e que as ruas asfaltadas não surgiram do nada, são frutos da gestão passada e de uma “força estranha” do governo do Estado, que ultimamente passou a calçar ruas de municípios aliados. Mas, até o momento, nada que possa ser chamado de avanço estrutural ou mudança profunda foi realmente visto.

No embalo das luzes de Gramado, cidade onde, vale dizer, já tive a oportunidade de morar e conhecer de perto o verdadeiro conceito de planejamento público, o prefeito trouxe para Camaragibe a sua grande vitrine: o “Natal Luz”. Não há dúvida de que projetos assim despertam emoções, reacendem memórias e mexem com o imaginário coletivo. Mas também é verdade que, diante da realidade econômica de Camaragibe, a grandiosidade do evento levanta mais perguntas do que respostas.

Ainda não visitei pessoalmente o espetáculo. Mas pelas imagens que circulam nas redes sociais, é possível concluir que, embora distante do sonho gramadense, não ficou atrás em ambição estética. O que resta saber, e essa resposta a gestão municipal evita oferecer é: de onde saiu tanto dinheiro para iluminar uma cidade economicamente apagada? Uma pergunta simples, mas que a gente deixa pra uma próxima matéria.

E aí chegamos ao ponto mais incômodo: as falhas gritantes, porém previsíveis, cometidas pelo prefeito. A primeira delas não é apenas um deslize, é uma infração. A queima de fogos, proibida pela Lei Estadual nº 17.195/21 e pela Lei do próprio Municipio nº 986/23, ignoradas como se leis fossem sugestões e não obrigações. Mas quem, em Camaragibe, ousaria fiscalizar o prefeito? Os mesmos vereadores que aplaudiam os fogos enquanto idosos tremiam, crianças choravam e animais entravam em desespero? Difícil.

Em Camaragibe, leis que deveriam proteger os mais vulneráveis já nascem condenadas ao esquecimento. Idosos, crianças, animais, todos relegados ao famoso “depois a gente vê”, um bordão não oficial, mas muito representativo da gestão pública local. Porque, no fim das contas, em Camaragibe sempre foi assim: a festa vem primeiro. As pessoas, por último.

A segunda falha, e menos relevante, foi politizar o evento e tirar o brilho do sorriso das crianças, que foi ofuscado pelo ilustre desconhecido que alternou com o brilho dos fogos o sorriso de quem almeja uma cadeira no congresso.

E é justamente por isso que, enquanto as luzes brilham no centro da cidade, o que continua iluminado mesmo é o óbvio: sem transparência, sem prioridades e sem respeito às leis, qualquer luz vira só mais um reflexo do velho espetáculo de sempre.

Marcus Oliveira

Marcus Oliveira

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